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Mostrando postagens de maio, 2024

PASTORAL

Meus caros amigos, Há muito tempo utiliza-se a palavra "pastoral" como uma espécie de palavra-talismã sob a qual se abriga qualquer coisa. Hoje gostaria de compartilhar uma experiência "pastoral", se assim a quiserem definir que já fiz várias vezes. O costume de praticamente nunca ter tirado a batina desde o dia da minha ordenação e de não ter funcionários para a casa, me levou a frequentar mercados, hortifrutis, lojas de material de construção etc. Como nem sempre tive carro, caminhar a pé ou ir de ônibus também proporcionou vários encontros "pastorais". A conversa com pessoas das mais variadas, geralmente seguia esses caminhos:  a) sempre fui de Igreja. Frequento lá no Padre tal. b) nunca fui da Igreja (protestantes etc) c) já fui (ou minha família foi) de Igreja, mas me afastei. d) não era de Igreja, mas hoje sou católico fervoroso. Bem.. a última quase nunca ouvi. A primeira era razoavelmente frequente, a segunda um pouco menos, e, quase igual à quanti

REFRÃO

 Meus caros amigos,  Existe entre muitos católicos atuais uma espécie de "neo-sionismo", um costume exarcebado de revolver os costumes e práticas judaicos e de algum modo incorporá-los à vida cristã. Isso não é saudável. Não se pode compreender o cristianismo como uma ramificação do judaísmo. O cristianismo é o vinho novo que só se pode colocar em odre novo, caso contrário o odre velho - o judaísmo - e o vinho novo se perdem, como ensinou Nosso Senhor. Porém, de um ponto de vista teológico, é necessário compreender determinados elementos da Antiga Lei, até para conhecer no que a Nova e Eterna Lei a suplanta. Nesse caso, podemos afirmar que os judeus não eram um povo, se assim se pode dizer, muito reflexivo, como os gregos. Os judeus do Antigo Testamento e aqueles contemporâneos de Cristo tinham uma mentalidade "mais prática", o que será uma das razões para que Cristo incorpore em seu ensinamento imagens do cotidiano, da vida, do trabalho, para que lhes fosse mais fá

OS ASSENTOS DO PECADO

 Uma psicóloga (se quem está lendo for mulher, passe tudo para o masculino!) muito jovem e bonita desenvolveu uma técnica para saber qual dos sete pecados capitais seus pacientes têm de forma mais aflorada, e que, certamente, é uma das principais causas das dificuldades que enfrentam na vida. Desse modo, nossa doutora pôs seis assentos em seu consultório. A cadeira um seria a sua própria cadeira. A cadeira dois seria uma daquelas cadeiras caras de fazer massagem. A cadeira três estaria próxima à porta. A cadeira quatro estaria próxima a um pote com balas e doces. A cadeira cinco seria praticamente igual à sua. E a cadeira seis seria reclinável, semelhante a um sofá cama. E, seguindo em seu "experimento", nossa profissional marcou para atender as pessoas que percebia estarem dominadas pelos pecados. O soberbo, sem pestanejar, sentou-se na cadeira da psicóloga. Afinal, o soberbo é sempre quem não se contenta com o seu lugar e quer mostrar sempre poder e superioridade. O avarent

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XXXI

 Meus caros amigos,  Chegamos ao final de nossas considerações sobre a Sequência Veni Sancte Spiritus, que pela perfeição poética de sua composição foi chamada de Sequência de Ouro. Deixamos para a conclusão algumas considerações sobre a sequência em si mesma. Primeiro, as sequências são hinos poéticos que desenvolvem (dão "sequência") melodicamente o último Aleluia antes do Evangelho. Há uma razoável quantidade de sequências, algumas estão consolidadas no Missal Romano, outras ficaram nos "próprios" das Ordens Religiosas (como Laeta Dies beneditino), outras foram abolidas tornando-se hinos para outros fins. A sequência em questão, como a grande maioria dos textos litúrgicos não tem nem exatamente uma data precisa, nem exatamente a certeza incontestável de um autor. Sabe-se que data entre os séculos XI e XII e costuma-se atribuir a Estêvão Langton, Arcebispo de Cantuária na época do Rei João Sem Terra. O que se sabe ao certo é que foi o Papa Inocêncio III que a intr

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XXX

Meus caros amigos, Nossa sequência chega praticamente ao fim, com um último pedido: Da perene gaudium - Dá a perene alegria. Certa vez esperando para me confessar - o local onde me confesso é cheio de pinturas bem antigas de vários santos - um homem que acompanhava uma senhora "reclamava" com ela sobre o fato de que nenhum santo sorria. Honestamente, nunca tinha reparado esse detalhe. Todos eles eram representados aqui na terra, como, por exemplo, S. Tomás de Aquino está escrevendo; e, realmente, ninguém sorri. Mesmo S. Gregório Magno, com o Espírito Santo ao seu ouvido enquanto escreve o "canto gregoriano", não sorri. E o comentário daquele homem não deixou de se repetir em minha mente ao ver tantas outras imagens. Mesmo Santos que foram exemplos de alegria como um S. Felipe Néri ou S. João Bosco, não costumam ser representados (ao menos tradicionalmente) rindo. Porém, ao ver várias representações dos Santos na Glória, como as que geralmente são feitas para as cano

MEDITAÇÕES SOBRE A SEUQÊNCIA DE PENTECOSTES XXIX

 Meus caros amigos, Quase chegando ao fim da nossa Sequência, voltamos também os olhos à nossa vida: "da salutis exitum": dá o êxito da salvação. Ao considerarmos a vida do homem sobre a terra, toda a sua existência, o que poderia ser considerado uma vida plena, uma vida completa, uma vida com êxito? A resposta à luz da fé é apenas uma: salvação. Nosso Senhor assim mesmo disse: "De que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro, se vir a perder a vida eterna?" O que pode ser mais importante do que a salvação? Do que o estar para sempre com Deus no Paraíso? Sem a salvação tudo no homem se perde. Melhor seria-lhe não ter nascido. Os fracassos, que não foram poucos, que encontramos na vida dos santos (algumas vidas de santos foram praticamente uma coleção de fracassos, incompreensões, perseguições, proibições...) não apenas não os abateram, mas os faziam compreender que o êxito, não são as honrarias, nem a glória passageira desse mundo enganador, mas simplesmente a salvaç

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XXVIII

Caros amigos,  Continuando nossa sequência e chegando em sua última estrofe, pedimos ao Espírito Santo três grandes graças. Graças que somente Ele, Espírito Consolador que habita em nossas almas, pode nos conceder. A primeira é: Da virtutis meritum, "dá o mérito da virtude". Aqui compreendemos o quanto essas duas palavras se completam: virtude e mérito. Se uma ação é realmente virtuosa diante de Deus, diante daqu'Ele único que pode conhecer as intenções mais profundas do coração, ela adquire diante de Deus um mérito do qual gozaremos na eternidade. A virtude liga a terra ao céu. É algo que se vive na terra para um dia se viver no Paraíso. Vive-se na terra com as limitações e dificuldades próprias dessa vida, e vive-se naturalmente no céu.  Pedir ao Espírito Santo que nos conceda o mérito da virtude, significa pedir que compreendamos que estamos nessa vida para adquirir virtudes, para irmos além de nossos desejos desordenados e buscarmos o mérito que nos abre a porta dos c

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XXVII

 Meus caros amigos, O verso seguinte da nossa sequência, tendo já expressado o pedido no verso anterior, traz o que se pede: sacrum septnarium, o sagrado setenário, numa referência aos sete dons do Espírito Santo: sabedoria, entendimento, conselho, fortaleza, ciência, piedade e temor de Deus. Em ocasiões anteriores tratamos de cada dom, e hoje não seria exatamente essa a nossa intenção. Sabemos que a teologia distingue três obras particulares do Espírito Santo: os dons, os frutos e os carismas. Particularmente no que se refere aos dons e aos carismas a diferença está que os dons estão mais ligados ao bem de quem o recebe e os carismas são bens que um recebe para o bem dos demais. Todos temos necessidade dos dons do Espírito Santo, mas essa necessidade se torna ainda maior quando a responsabilidade pessoal aumenta diante de momentos excepcionais, como uma guerra, por exemplo. Existe uma ordenação desejada por Deus em todas as coisas, e essa ordem se manifesta, em circunstâncias normais

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XXVI

 Meus caros amigos,  Conquanto a Personagem principal da nossa sequência seja o Divino Espírito Santo, o verso que hoje meditaremos, traz uma breve explicação sobre quem são os fiéis (fidelibus) do verso anterior: "In te confidentibus": "Em ti confiantes". Ou seja, ao crer segue a confiança. O crer sem confiar, se assemelharia ao estudo de uma mitologia, que embora possa ser interessante, pitoresca, curiosa, não enlaça a alma na confiança ao que se sabe. S. Agostinho diz isso de forma semelhante, se consideramos que a confiança em Deus é fruto do amor que temos por Ele e que sabemos que Ele tem por nós, ao afirmar que se "creres e não amas és como os demônios", como já dizia S. Tiago que também os demônios crêem e estremecem. Em certo sentido, as "profissões de fé" mais belas e completas que trazem os Evangelhos são feitas por pessoas que estavam sob a ação do diabo. O diabo sabe, mas não ama, não confia. O seu "non serviam" a sua negaç

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XXV

 Meus caros amigos, Iniciando o último grupo de duas estrofes, a Sequência diz: Da tuis fidelibus - Dá aos teus fiéis. Já meditamos anteriormente sobre esse ser fiel, mas hoje gostaria de me aprofundar um pouco mais nesse termo, baseando-me um pouco em percepções que grandes personagens da história brasileira tiveram. Se considerarmos os primeiros redentoristas vindos da Alemanha para o Santuário de Aparecida em São Paulo, se considerarmos o futuro Cardeal Dom Sebastião Leme, quando ainda estava no Nordeste e, um pouco mais para a segunda metade do século XX, se considerarmos Dom Antônio de Castro Mayer no interior do Rio de Janeiro, perceberemos que, mesmo em épocas distintas os três chegaram a mesma conclusão: o povo brasileiro é muito religioso, é muito crente, mas não e muito fiel. Explico-me. O brasileiro de ontem e também o de hoje, não tem grandes dificuldades para "acreditar", mas se esse acreditar não o tornar um autêntico fiel do Espírito Santo, que é sinônimo de se

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XXIV

 Meus caros amigos, O próximo pedido de nossa sequência é de que o Espírito Santo assuma a direção de quem se desviou: "Rege quod est devium".  Ora, meus amigos, o desvio supõe uma possibilidades de caminhos, já o salmo primeiro exalta o homem que escolhe o caminho reto, o caminho de Deus. Na Torah, Deus também apresenta ao homem: "a vida e a morte, a bênção e a maldição" e quase que numa súplica ao homem acrescenta: "escolhe, pois, a vida". A liberdade do homem ou o seu livre-arbítrio, não consiste na capacidade de escolher entre bem e mal, mas entre um bem e outro bem ainda superior. A escolha do mal, embora sempre possível, na verdade não é liberdade, mas escravidão. Ainda assim, há tantos que se desviam. Que destinados ao céu pela vontade salvífica universal de Deus, escolhem outros caminhos e nenhum caminho leva para o Caminho. Quando a expressão "caminho" assume uma proeminência no diálogo de Jesus com os Apóstolos na última ceia, S. Tomé d

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XXIII

 Meus caros amigos, a nossa sequência traz em seguida um novo pedido ao Espírito Santo: "fove quod est frigidum", ao meditarmos nesse verso, a primeira doce dificuldade que temos é bem traduzir esse verbo: "fove", porque ele não significa apenas um aquecer, semelhante a botar fogo novamente, mas também é o verbo que usaríamos para dizer a ação da mãe que afaga o filho, aquecendo-o com o calor do seu próprio corpo. É assim que nós, frígidos, frios, somos tratados pelo Espírito Santo. Somos acalentados por Ele. O Espirito Santo vem aquecer os corações em que a vida espiritual tornou-se difícil, monótona, até mesmo dura. Ele sabe que para nós é mais difícil perseverar no bem que deixar de fazer o mal, que rezar a cada dia, com perseverança, com atenção, elevando realmente nossa mente a Deus nos custa. E Ele vem nos aquecer. Esse acalanto do Espírito Santo se soma também a nossa ação. Quando nos falta o gosto na oração mais demorada, mais substanciosa, não neguemos a De

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XXII

 Continuando nossa reflexão conduzida pelos versos da Sequência de Pentecostes "Veni, Sancte Spiritus", a qual ouviremos na Santa Missa do santíssimo dia de Pentecostes, hoje, e nos próximos dias, na Oitava de Pentecostes, meditaremos sobre o seguinte verso: "flecte quod est rigidum", isto é, flexiona o que é rígido. Obviamente, numa tradução, podem aparecer vários outros sinônimos para "flecte" e para "rigidum", mas o sentido mais imediato dessas palavras latinas é esse. O Espírito Santo é aquele que é capaz de flexionar o que se tornou rígido. Ora, se consultarmos a Sagrada Escritura, a primeira "reclamação de Deus" por alguma rigidez se refere à dureza de coração e de cerviz do povo eleito: um coração duro que mesmo diante de tanto carinho não ama e uma cerviz dura que mesmo diante de tanto poder não se inclina. O Espírito Santo é aquele que torna o coração capaz de amar e aquele que leva a alma e o corpo a inclinar-se diante de Deus

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XXI

 Caros amigos, Continuando nossas reflexões sobre a sequência de Pentecostes, encontramos um verso que parece tanto mais apropriado para os nossos dias: "sana quod est saucium", muitas vezes, traduzido como curar o que está enfermo ou doente. Porém, a expressão "saucium" se aplica melhor ao que foi ferido. Uma doença ou enfermidade não necessariamente se referem à uma ferida, porém é esse o ponto em que eu gostaria de me deter um pouco. Nessa estrofe reconhecemo-nos como feridos, feridos por nós, feridos por nossos pecados, feridos pelos outros... Não é a extrema sensibilidade do homem moderno um sinal de que esteja coberto de feridas?  Mesmo entre os membros de uma família, por vezes se está numa espécie de terreno minado. Fora de casa, nos ambientes de trabalho e outros relacionamentos ou ficam numa absoluta superficialidade ou, com o mínimo de profundidade, se quebram, muitas vezes para sempre, tornando a convivência insuportável. O homem moderno não está apenas

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XX

 Meus caros amigos, Continuando na consideração do Espírito Santo como água viva, além da purificação interior que meditamos ontem, a sequência pede: riga quod est aridum, "rega o que é árido". Não poucas vezes, em nosso itinerário para Deus, temos que lidar com a aridez espiritual, que, basicamente, seria a absoluta perda de consolações, seja nos sentidos, seja no espírito. Essa aridez, quando vinda de Deus, purifica a alma fazendo com que busque mais "o Deus das consolações do que as consolações de Deus", como recordava S. Teresa. Porém existe uma aridez que não é essa operação divina na alma, mas que simplesmente é fruto de nossa displicência na vida espiritual e que é a mais comum. A aridez operada pela graça fortifica o homem na sua busca de Deus, a que é fruto de nosso desleixo enfraquece a busca de Deus. Ora, meus amigos, sabemos quem é Deus? Sabemos o que é a oração? Compreendemos o que a oração necessita de nós, como recolhimento interior (que não se alcanç

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XIX

 Meus caros amigos, Começando um novo grupo de estrofes, a nossa sequência apresenta novos pedidos, bem diretos, ao Espírito Santo. O primeiro deles é: "Lava quod est sordidum". Creio que quase não precisaríamos traduzir essas palavras: Lava o que é sórdido. Aqui, creio que poderíamos nos deter na primeira e última palavra desse verso. Primeiro, lava. O Espírito Santo é aquela água viva que Nosso Senhor promete no poço de Jacó. Como água é sinal de vida e de purificação. Precisamos de vida, mas de uma vida pura, como pedimos no hino Ave, Maris Stella à Nossa Senhora. Para que a vida seja pura, o Espírito Santo, como água viva que é, não apenas concede a vida, mas também limpa, lava. Mas, nesse viés, é forte a expressão que a sequência traz, não apenas o impuro ou sujo, mas o sórdido. Na linguagem habitual dos santos, a castidade identifica-se com a pureza, e a impureza é sinônimo de não-castidade. Quando se fala em pensamentos impuros, não se refere tanto à pensamentos contra

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XVIII

 Meus caros amigos, Sem o Espírito Santo nada, nem mesmo o homem existiria. Ele é, como recordamos, o "Creator Spiritus" o Espírito Criador. Porém, enquanto todo o criado segue o caminho traçado por Deus, sem por isso ser virtuoso, uma vez que não possui inteligência e vontade; o homem foi criado por Deus como Sua imagem e para ser Sua imagem através da virtude. Assim, Deus concedeu ao homem a liberdade para escolher entre um bem e outro bem ainda maior. Assim os que se deixam conduzir pelo Espírito Santo usam de sua liberdade, enchendo o coração humano de coisas boas, santas, virtuosas. No verso de hoje, a Sequência reafirmando a ideia anterior, a reforça dizendo que "nihil est innoxium". Ou seja, sem o Espírito Santo, não apenas é impossível que haja o homem, como mais impossível ainda haverá um homem bom: "nada que seja inocente". Sem a graça do Espírito Santo, sem a Graça incriada que é o Espírito Santo, nada de inocente reside no homem, e mesmo o que

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XVII

 Meus caros amigos, O verso seguinte de nossa sequência é "nihil est in homine" , nada há no homem.  Estamos nos referindo ao "numine" ao poder divino do Espírito Santo, sem ele, nada. Aqui nos ajudará um hino especialíssimo ao mesmo Espírito, chamado Veni Creator. Nada há no homem porque o Espírito Santo é Creator Spiritus, Espírito Criador. Nada há no homem porque sem o poder do Espírito Santo o homem não existiria. Nesse sentido, compreendemos como o ato de criar, de dar o ser de tirar do nihil, do nada, é tão próprio de Deus e de seu Espírito. Ele não apenas tira o homem do limo da terra, como que é o sopro vivificante insuflado no homem, permitindo-lhe o ser. Nada há no homem... Porque sem ele não há homem. Sem ele não haveria uma criatura sequer, particularmente o homem que mais do mais um ser vivente é criado à imagem de Deus. Sem o Espírito Santo o homem não seria o que é. Por isso, a ação d'Ele em nossas almas não nos torna menos humanos, ao contrário.

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XVI

 Meus caros amigos, O verso seguinte que inicia uma nova estrofe, traz a seguinte frase: "sine tuo numine". A expressão numine, em alguns autores antigos sinônimos da própria divindade, aqui é compreendida como a força de Deus. Sine tuo numine, sem a tua força divina. Não se trata apenas de um poder ou de uma força. Mas exclusivamente do poder e da força de Deus. Nunca é demais reafirmar a divindade do Espírito Santo. E, por consequência o poder divino de suas ações. O Espírito Santo não é criatura, um ser criado, o que não resulta participação na natureza do Criador, mas é procedente, e ao proceder, participa da natureza de Quem procede, isto é do Pai e do Filho. Por isso, embora falemos em "devoção" ao Espírito Santo, falamos no mesmo sentido de "devoção" ao Santíssimo Sacramento, ou seja, nesses casos, a devoção é coincidente com o culto latrêutico devido a Deus mesmo. Adoramos o Espírito Santo no seio da Trindade e também no seio de nossa alma se perse

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XV

 Meus caros amigos, O Espírito Santo, Luz Beatíssima, enche o íntimo do coração "tuorum fidelium", "dos teus fiéis". Mas, quem são os fiéis do Espírito Santo? O que é ser Seu fiel? A palavra fiel na Sagrada Escritura assume diferentes nuances, e todas elas juntas dão como que a legítima interpretação dessa palavra. O fiel é, podemos assim considerar, aquele que vive da fé. É o que crê. E crê no que ouviu, como diz S. Paulo: " a fé vem pelo ouvir". A Igreja sempre considerou a plena acessibilidade da fé, a simplicidade do ato de crer nas verdades reveladas por Deus através da Igreja. Ou seja, o pleno assentimento ao que escutou da Igreja. Nesse sentido, nada se opõe mais ao fiel do que o gnóstico. Do que aquele que precisa ser iniciado em determinadas coisas secretas e que em determinado momento é tomado como que por um força secreta que lhe abre os caminhos da mais elevada intelectualidade.  Não.  O fiel é aquele que tendo aderido, isto é, tendo considerad

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XIV

 Meus caros amigos, Na meditação anterior considerávamos que a Igreja chama de forma mais intensa o Divino Espírito Santo, o que se deu pela invocação O lux beatissima, "Ó Luz Beatíssima". E consideramos também o quanto a nossa sequência insiste na associação do Espírito Santo como Luz, o que podemos compreender como sinônimo de Verdade. Verdade não apenas como um conjunto de proposições sumamente verdadeiras, mas Verdade enquanto Pessoa, enquanto Deus. De fato, a pergunta que Pilatos dirige a Cristo no contexto dramático de Sua Santíssima Paixão: "O que é a verdade?", resume a busca mais íntima de todo homem que seja capaz de refletir minimamente sobre a própria existência. Todo barulho, em grande parte proposital em que estamos submersos, desde os barulhos de buzinas e motores até às músicas que são propostas como "sucessos" visam unicamente destruir no homem esse instinto sobrenatural de buscar a Verdade. E para aqueles que ainda a tentarem buscar, apre

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XIII

Meus caros amigos, Embora toda a nossa sequência seja um chamado ardente, uma exclamação do mais profundo da alma cristã, o verso que hoje meditaremos é o único em que a marca do vocativo latino "O" se faz presente: "O lux beatissima", Oh, luz beatíssima. Esse "Oh" situado quase no meio da sequência, manifesta o enlevo da alma que anseia pela luz do Espírito Consolador, ou tanto melhor, pela Luz que é o Espírito Consolador. A interjeição "oh" não é um mero recurso linguístico na tradição poética da Igreja, mas é como que um "salto da alma" quase que um arrebentar-se desse corpo material para "rompendo a tela desse doce encontro" como dizia S. João da Cruz, celebrar sem demora os desposórios místicos com o Amado. Não é à toa que praticamente todos os hinos eucarísticos compostos por S. Tomás de Aquino por exemplo, tragam sempre esse interjeição: O sacrum convivium, O salutaris Hostia, O res mirabilis etc. O Oh é esse grito da a

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XII

Caros amigos,  Certamente uma das mais carinhosas palavras que a nossa sequência traz é o verso que meditaremos hoje, palavras que se tornam ainda mais ternas quando consideramos hoje a Festa da Ascensão do Senhor: in fletu solatium, consolo no choro. As lágrimas, meus amigos, são para muitos o pão cotidiano, como diz o Salmo: "vós nos destes a comer o pão das lágrimas...". Dentre esses lágrimas encontraremos razões às vezes mais, às vezes menos nobres. Há quem chore, sem necessidade e os que com necessidade, não choram. Mas, em todo caso, com ou sem lágrimas visíveis, o sofrimento é o grande companheiro do homem nesse mundo para o qual já nascemos envoltos em lágrimas. A ação do Espírito Santo não consiste na negação do sofrimento ou numa mais ou menos contrariada aceitação dele, uma espécie de resiliência sobrenatural. Não. O Espírito Santo se torna consolação. Ele que não impede o que causa as nossas lágrimas, está junto a nós para enxugar as nossas lágrimas. Ele é não ape

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES XI

  Meus caros amigos, Ainda mantendo o pensamento na consolação que o Espírito Santo produz na alma fiel, a sequência fiz que Ele é: “in aestu temperies”, numa tradução mais livre poderíamos dizer que “no calor Ele se apresenta como uma temperatura suave”. A expressão “temperies” quer lembrar o justo, o moderado, o sem exageros, o temperado (que tem a virtude da temperança). Materialmente o clima temperado não é o calor dos trópicos, mas uma mescla e sucessão de climas de forma ordenada e sem rigores. No coração humano, onde arde o calor das paixões, o Espírito Santo vem para “temperar” para moderar. Para constituir a justa medida de cada coisa. Igualmente na vida cotidiana, quando nos sentimos sufocados e oprimidos, sem refúgio ou lugar, o Espírito Santo abre sobre nós as suas asas, como diz o salmista: “Eu exultatei à sombra de tuas asas”. Também S. Gabriel na Anunciação se refirirá ao Espírito Santo como a Sombra do Altíssimo que A cobrirá.  Ele é Poder, e Sombra, Fogo e Conforto.

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES X

 Meus caros amigos,  A sequência, então, chama o Espírito Santo como "In labore requies": "Descanso no trabalho". O trabalho é a condição habitual do homem sobre a terra, e após o pecado original esse trabalho se tornou causa de grande cansaço, esforço e suor para o homem, levando o homem então constantemente ao cansaço. O trabalho segue o homem em todos os aspectos da sua vida. É a custa do trabalho que vive, se alimenta, aprende, estuda, desenvolve as artes, nada há sem que para tal o homem trabalhe. Também para Deus o homem trabalha seja pela oração seja pelo esforço que, com a graça de Deus, aplica na fuga do pecado e busca da perfeição. Assim, não é de se admirar que o homem se canse. Se canse sobretudo na perseverança no bem, que, segundo S. Tomás é mais empenhativa que a renúncia dos pecados. Portanto, uma vez que o homem inevitavelmente se cansa, resta saber "onde" descansará. Para ser esse descanso apresentou-se Jesus: "Vinde a mim todos vós

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES IX

 Meus caros amigos, Continuando a nossa sequência, ouvimos "Dulce refrigerium", Doce refrigério. Esse verso se assemelha bastante ao verso anterior e ao seguinte. Na semelhança com o verso anterior está a palavra "doce". A doçura foi o modo como a Igreja quis significar a suavidade, a delicadeza, o acalanto com que o Espírito Santo age na alma. Ele é forte, é criador, é fogo abrasador. Mas seu modo de agir é doce. Ele não se confunde com os espíritos atormentadores ou possuidores dos homens que os violentavam em suas vontades fazendo-os agir de forma contrária. Não. Ele é sussurro, é brisa, é conselheiro, é amigo. E vento impetuoso e mansa brisa. E o seu modo ordinário de agir é sempre doce, suave, calmo, sereno. Pensemos numa cerimônia de Crisma.  Vêm o Bispo com os ajudantes, se posta diante do altar, reza algumas orações, reza sobre os que serão confirmados, e estes de joelhos recebem a unção com o Santo Crisma em suas frontes, enquanto o Bispo diz: "Eu te m

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES VIII

 Meus caros amigos,  Uma das invocações mais ternas com que a Igreja chama o Divino Espírito Santo e com a qual muitos santos se referiam a Ele é "dulcis hospes aninae", doce hóspede da alma. O Espírito Santo habita em nossas almas, desde que esta se conserve na graça de Deus, habita como hóspede. Essa expressão é teologicamente maravilhosa por traduzir as ações do Espírito Santo: primeiro Ele não se confunde com a alma, Ele não é uma centelha divina que nos torna outros deuses, como, por exemplo, se encontra no pensamento hinduísta, a sua habitação na alma não causa uma dissolução sua na alma. Permanece distinto dela, podendo habitá-la mais ou menos de acordo com a abertura que o homem lhe concede e pode mesmo ausentar-se dela, deixando-a morta, se praticou-se a desgraça do pecado mortal. Ele é doce porque sua presença é suave, serena. Não há possessão do Espírito Santo, mesmo aquele que age movido pelo Divino Espírito Santo o faz livre e conscientemente, muitas vezes sem da

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES VII

 Meus caros amigos, Iniciando uma nova estrofe, a Sequência começa a chamar o Espírito Santo com vários nomes, o primeiro deles é "Consolator optime", Ótimo, perfeito, consolador.  Consolador é um dos primeiros nomes com o qual Nosso Senhor despedindo-Se dos Apóstolos na Última Ceia se refere ao Espírito Santo. É Ele que consolará os Apóstolos quando da ausência do Senhor, depois de sua subida aos céus. Pensemos um pouco nos consoladores com os quais nos encontramos. Desculpem o exemplo que darei, mas penso naqueles "consoladores" que encontramos no contexto da morte. Há aqueles que repetem os mesmos refrões, as mesmas fórmulas, as mesmas palavras vazias, com a mesma expressão de nada. Há os que pretensamente indo consolar, parecem querer disputar o grau de sofrimento e acabam por parecerem mais sofridos que os próprios enlutados, por fim há aqueles que sabendo que nada nem no céu e na terra pode servir àquele momento, consolam com a presença, sem grandes discursos

MEDITAÇÕES SOBRE A SEQUÊNCIA DE PENTECOSTES VI

 Meus caros amigos, Há algum tempo meditávamos sobre "o raio de tua luz" que a Igreja pede que o Espírito Santo envie dos céus. Hoje, meditaremos na invocação que a sequência traz na qual chama o Espírito Santo de "lumen cordium", que comumente é traduzido como "luz dos corações". "Veni, lumen cordium": Vem, luz dos corações. Quando meditamos no raio da luz, recordamos uma espécie de luz independente, luz em si mesma, tal como no início da criação Deus separa a luz das trevas antes mesmo de criar o sol. Portanto, quando pensamos em luz, podemos considerar duas espécies: uma luz em si mesma, como o raio; e uma luz fruto de uma combustão, como a luz que brota do fogo, como a luz de uma candeia. Essa parece ser a tradução melhor para "lumen", que não é tecnicamente sinônimo de "lux". Recordemos que na Vigília Pascal, a Igreja ao apresentar o círio não diz: Lux Christi, mas Lumen Christi. O fogo que se alimenta da "cera virgi