O CASO DE MONS. VIGANÓ

 Chegou ao conhecimento do mundo todo que por um processo extra-judicial o Arcebispo Viganó foi excomungado. Basicamente as acusações contra o Arcebispo foram de negar o pontificado de Francisco, opôr-se ao seu magistério e não aceitar o Concílio Vaticano II.


Gostaria de aqui apresentar uma reflexão que possa contribuir à discussão de pessoas mais aptas para esse tipo de controvérsia.


Indo na ordem que apresentei, acusa-se o Arcebispo de negar o papado de Francisco. Se isso é verdadeiro, o Arcebispo naturalmente caiu em cisma e, sim, estaria excomungado. Não sou perito no caso Viganó e devo confessar que não tive muito ânimo para ler todas as suas declarações, mas nas que li, ou nas partes que li, sendo bem honesto, não identifiquei uma afirmação clara que negasse o papado de Francisco.

Poderíamos considerar palavras duras e talvez inoportunas e ambiguas como “indignamente sentado no Trono de S. Pedro”, que poderia significar uma indignidade fruto de pecados etc ou a indignidade de ser um falso papa.

O ponto é relativamente simples, respondido com um sim ou não: Francisco é o Papa? Se o Arcebispo Viganó responde com um sim, mas crítica uma série de declarações e atitudes de Francisco, ele estaria dentro dos seus direitos como Bispo Católico, inclusive de resistir em face ao Papa e denunciar os seus erros.

Mas se a resposta é que Francisco não é papa, então o Arcebispo Viganó perde todos os direitos que teria. 

Alguém afirmou que a prova de que Viganó não aceita Francisco como papa seria o fato de chamá-lo pelo sobrenome: Bergoglio.

Bem, isso não prova nada. Muitos falam em Papa Pacelli ou Papa Della Chiesa ou Papa Mastai sem com isso negar o pontificado deles, aliás o nome Papa antes do sobrenome já indicaria isso.

Como disse, não sou especialista no caso Viganó, mas creio que quando ele se envereda por um caminho de “falha de consentimento” do Papa ao assumir o Pontificado etc, aqui estaria o ponto que deveria se rejeitar, por ser o ponto que lhe levaria a não aceitar o Pontificado de Francisco como válido, e que por isso justificaria a sua excomunhão.


Porém, o segundo ponto é mais preocupante. Porque valida a excomunhão no fato de que Viganó tenha sido crítico e resistente à muitas declarações de Francisco, talvez até acusando-o de heresia.

Aqui gostaria de fazer duas distinções.

Especialmente se se leva em conta a tal da colegialidade, na qual as grandes decisões devem ser compartilhadas etc, é estranho que se queira calar toda voz dissonante. Aqui a Igreja se assemelharia lamentavelmente aos grandes governos populares onde o povo ocupa o último lugar.

Como afirmei acima, é direito de um Bispo cobrar um Papa, tal como S. Paulo, um Bispo, confrontou S. Pedro, um Papa. Certamente haverá modos e palavras a serem adotados para isso, que uma vez esgotados talvez se tenha que ir para uma oposição aberta e certamente dolorosa. 

Mas as palavras heresia, herege não cabem aqui.

Se alguém fala algo errado, do ponto de vista teológico, eu, um simples padre, posso dizer que a pessoa é um herege. Mas essa minha definição tem quase o mesmo peso de quando eu vejo alguém assoando nariz e digo: “é gripe”.

A minha fala “é gripe” está no campo do senso comum. Eu não posso dar atestado médico, ou receita etc. E pode não ser gripe, mas dengue. Somente um médico pedindo certos exames é que pode “infalivelmente” dizer: é gripe.

Assim, há na Igreja tribunais e juízes que existem (ou deveriam existir) para examinar falas, escritos etc e chegar ao diagnóstico correto: heresia, ignorância etc.

De modo que reconhecer que tal declaração não está conforme o que a Igreja sempre ensinou, às vezes é um ato mais elementar de atividade cognitiva, mas a declaração de heresia no sentido estrito, não cabe nem a um padre.


Por fim, refiro-me à plena aceitação do Concílio Vaticano II. O que já escrevi anteriormente ser impossível. Ora, para dar um exemplo bem simples, o Concílio manda permanecer o latim na liturgia, mas também introduzir o vernáculo. O Concílio Vaticano II é impossível de ser aceito, porque ele mesmo é contraditório.

Pensemos que um padre do Opus Dei celebra em latim, coberto de rendas e diz que está obedecendo ao Concílio e outro padre celebra num dialeto indígena na mesa da sala de estar de uma família, com um paninho por cima dos ombros dizendo que está obedecendo ao Concílio. E o pior é que estão. Cada um na parte e na interpretação que mais lhe apraz.

É impossível aceitar plenamente o Concílio Vaticano II sem ficar louco.


Sendo impossível aceitar, já poderíamos compreender que ninguém pode estar obrigado a isto. Porém, se fosse possível, haveria essa obrigação? 

A resposta é não.


Ao se colocar fora -e afirmar isso - do que a Igreja considera necessário para que se esteja assegurado pela infalibilidade, a aceitação do Concílio Vaticano II não pode ser exigido para que um fiel seja católico.

E exigir isso de um fiel, mais ainda de um Bispo, é ir contra o que os próprios papas, particularmente Paulo VI, afirmaram sobre o estilo literário e a intenção subjacente do Concílio de ser unicamente pastoral.


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