Papa mal assessorado

 Há muitos mitos romanos.

Em seu próprio início, conta-se que Roma foi fundada por dois irmãos, Rômulo e Remo, que alimentavam-se do leite de uma loba.

E assim, Roma, Caput Mundi, Capital do Mundo, sempre trouxe em si uma mistura de histórias e estórias, como se distinguia antigamente graficamente a realidade do mito.

Mas os mitos romanos continuam, particularmente um: a mal assessoria do Papa.

Para se garantir que o Papa em si mesmo é praticamente inerrante (o que é bem diferente do dogma da infalibilidade), todas as gafes doutrinárias papais se devem a um erro de algum de seus assessores.

Consideremos que seja assim. Tentemos acreditar nisso.

Então João Paulo II é informado de que terá um gesto de acolhida em sua viagem a Índia que consiste em que uma senhora passe uma substância em sua testa, o que seria um modo de dizer: “Bem-vindo”. Obviamente que o Papa, concorda com tal gesto.

Acontece que o gesto é na verdade um ato religioso, onde o Papa é ungido por elementos que nem vale a pena comentar quais são, por uma sacerdotisa de um dos vários deuses hindus, como um gesto de bênção e proteção.

Qualquer católico ficaria perplexo diante disso.

Como? Absurdo!

Qual é a solução? Esse gesto foi programado por um assessor do Papa que provavelmente desconhecia esse caráter religioso (pagão), por isso o permitiu. O Papa foi apenas vítima de um mal assessoramento.

Mas... se assim fosse, porque não houve uma nota da sala de imprensa do vaticano retificando tal ação?

É porque é necessário manter o mito da mal assessoria, dito a boca miúda a cada vez que um Papa provoca a perplexidade dos seus fiéis. De modo que o mesmo gesto que entre poucos é lamentado, muitas vezes na imprensa oficial, mesmo a imprensa oficial do vaticano, é louvado como um ato de aproximação humilde da Igreja perante as outras religiões.

Sabe-se que quando um cardeal foi enviado a um mosteiro para que este, até então fiel à Tradição da Igreja, se anexasse ao que eram as comunidades Ecclesia Dei, os monges narraram ao cardeal as atrocidades cometidas em várias dioceses e o Cardeal com semblante triste lamentava tudo, dizendo que o Papa desconhecia aquilo e que ele mesmo informaria o Papa de tais abusos.

A pergunta é: quantos Bispos foram removidos por suas posturas heterodoxas após essa visita do Cardeal? Nenhum.

De modo que ou esse Cardeal faz parte dos maus assessores, ou simplesmente não interressou ao Papa retirar de seus cargos os que destruíam a largos passos a fé de sempre da Igreja.

É evidente que há 110 anos, poderíamos pensar num Leão XIII pouco informado, ou mal informado ao ponto de propor a conciliação dos católicos com o movimento republicano na França, ação da qual, conta-se (mito?) que o Papa no fim de sua vida reconheceu ter sido absurdamente equivocada.

Mas hoje?

Dizer que um Papa seja mal informado é mais ofensivo do que dizer muito respeitosamente que ele poderia ter tomado outra postura diante de determinado fato.

A verdade é que entre os que assessoram um Papa, particularmente nos últimos 50 anos, poucos se distinguiram por sua fidelidade à doutrina de sempre da Igreja. E nem sempre o Papa foi inconsciente ao chamar para si essas pessoas. É verdade que na Cúria, nos altos cargos, sempre se tentou manter um certo equilíbrio entre conservadores e progressistas, mas aqui está já a raiz do problema: se o conservador diz x e o progressista diz y, podem os dois estar certos? Não estaria necessariamente ao menos um dos dois errados?

A parábola do trigo e do joio é uma realidade do mundo e da Igreja, mas que não pode ser provocada, elevando o joio à mesma categoria do trigo para tentar produzir um equilíbrio de forças. Ao joio, destina-se o fogo, mas no tempo oportuno.

O fato também está em que os ditos conservadores, de modo geral são piores que os progressistas. Porque consideram a sua “conservação” como um favor ao qual todos os católicos deveriam agradecer genuflexos. E não admitem que se lhes lembre que o seu conservadorismo às vezes, para ser gentil, não é suficiente para que seja simplesmente católico.

E isso num ponto tal, que muitas vezes a Tradição encontra mais “acolhida”, para usar um clichê atual, entre os ultra-progressistas do que entre os conservadores. Um Dom Mauro Morelli, Bispo de Caxias que desfilou numa escola de samba, perseguiu menos a Missa Tradicional do que um Dom Eugênio Salles que proibia que as escolas de samba de usar elementos da religião católica.

A equação que se põe diante de qualquer católico que queira manter esse nome é que enquanto houver um problema no governo da Igreja Universal, problema este que consiste no relativismo e na tentativa de agradar ao mundo com seus revezes ideológicos, colocar-se mansamente sob essa hierarquia é provocar a própria destruição.

A resistência ao governo da Igreja Universal e até mesmo nas dioceses é, em certo sentido, a resistência que um filho deve ter para com um pai que ora lhe manda coisas boas, ora coisas ruins. De modo que não se julga a pessoa que manda, mas a ordem. Não se entra no mérito se o pai é pai. Não se cogita pedir um exame de DNA. Simplesmente se sabe, pela mais simples inteligência que ir à escola é bom, mas roubar é mal. Se o pai ordena ir à escola e na volta roubar dois limões da quitanda, faz-se só a primeira parte.

A ideia de que quem obedece nunca erra, é valida apenas se a matéria da obediência não contradiz alguma ordem de Deus ou da Igreja. Aliás nos bons manuais, essa ressalva sempre foi feita. E aquele que obedece uma ordem iníqua, sabendo da sua iniquidade não fica isento de culpa.

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