DONS PASCAIS - ESPÍRITO SANTO

Imaginemos, meus queridos amigos, que existisse um povo que nunca conheceu nada doce. Não há frutas, mel, açúcar... nada. Toda a sua vida se resumisse a coisas onde a presença de coisas doces fosse absolutamente desconhecida.

Pouco adiantaria falar de açúcar, bolos, doces... As pessoas até poderiam imaginar o que seria o doce, mas nunca saberiam o que é o doce.

Quando vemos a pregação de Nosso Senhor, vemos que na imensa maioria das vezes Cristo trata da caridade e da fé. Ele não deixa de tratar sobre a esperança, mas ela não ocupa um lugar principal, pelo fato de que para as demais pessoas era impossível ter esperança. Ainda não podiam conhecer a verdadeira esperança.

As pessoas podiam ter otimismo, pensamentos positivos, boas perspectivas, mas que necessariamente teriam que ser concluídas com o "famoso final feliz". Elas poderiam perdoar quem lhes pedisse perdão, poderiam não fazer o mal a seus perseguidores, na esperança que Deus "lhes faria vingança".

Mas não era o suficiente. Não para Jesus. Mas era preciso esperar.

Quando os evangelhos foram escritos, é importante sabermos que não haviam vírgulas, parágrafos, e que todas as palavras eram escritas sob a mesma forma (maiúscula ou minúscula) ECOMOSEVOCELESSEESSETEXTODESSEMODO.

Quando você lê "espírito" você sabe que estou falando da alma de uma pessoa, e quando você lê "Espírito" sabe que está lendo sobre o Espírito Santo, mas as primeiras gerações cristãs ao lerem ESPÍRITO ou espírito só compreenderiam sobre quem se tratava de acordo com o contexto, e às vezes o contexto não era absolutamente claro.

É assim que precisamos compreender, por exemplo, quando no Evangelho de João é dito que Jesus inclinando a cabeça, deu o espírito, pode igualmente ser entendido como "deu o Espírito".

O Espírito Santo não é a alma de Cristo. Mas a entrega do espírito de Cristo, coincide com a entrega do Espírito Santo aos homens. "Se eu não for, Ele não virá"...

Jesus em sua pregação não se refere tanto à esperança, porque ninguém poderia saber o que é a esperança sem a presença do Espírito Santo. Como o povo que desconhecendo absolutamente o que é uma coisa doce, não adiantaria muito falar sobre uma cocada.

O Espírito que Jesus entrega na sua morte vem exatamente para que se compreendesse a sua morte. Desde os Apóstolos até os dias de hoje é o Espírito Santo que faz a Igreja enxergar a morte de Cristo com os olhos da esperança, o que se manifestou com expressões belíssimas de poesia que cantamos nesses dias: Cruz, Única Esperança; Deus reinou a partir da Cruz; Árvore ornada com a púrpura do Rei e tantas outras.

E é porque é conduzida pelo Espírito Santo que a Igreja pode ter a sua língua, seu idioma, o "esperancês".

Assim os assassinados por causa de Jesus são as "testemunhas", os "heróis", suas sepulturas são chamadas de troféus, a morrer se diz adormecer, amar se diz dar a vida etc.

Jesus já tinha falado em esperancês muitas vezes, mas só com o Espírito Santo dado em sua morte e ressurreição é que os Apóstolos conseguiram entender o que de fato Jesus tinha dito.

A marca de que recebemos o dom pascal que é o Espírito Santo se dá por duas "provas", a primeira é a não necessidade de finais felizes, ou, se preferirem, a compreensão de que só haverá um final, que está nas mãos de Deus, e que, por isso, se formos fiéis, será feliz. 

Para quem está em Deus todo final é feliz. Foi feliz o final de um mártir, de um confessor, de uma virgem... os que morreram de velhice como um santo abade de Cluny ou uma menina que morreu defendendo-se de um estupro, todos tiveram um final feliz. Porque quem fez o final não foi a velhice ou a violência, quem fez o final foi Deus.

A segunda é o amor para com aqueles que nos conduzem aos nossos finais, especialmente os não felizes.

É impossível amar os inimigos sem a certeza de que todo o mal que tentam nos fazer, só serve para aumentar a nossa glória junto de Deus. Pedro, antes do Dom Pascal já considerava difícil perdoar o inimigo que viesse sete vezes pedir perdão, com o Espírito Santo o perdão sequer supõe o pedido de perdão do inimigo.

Enquanto eu me sinto prejudicado pelos que me fazem mal, será impossível amá-los. Aliás sequer desejarei ver a cara deles. Mas, quando eu compreendo que eles - sem querer - estão me aproximando de Deus, estão assemelhando a minha pobre vida à Vida de Jesus, estão abreviando meus dias nesse vale de lágrimas para poder ver a Deus eternamente... Nossa! A raiva quase instintiva que sentimos, praticamente se transforma em gratidão e é nessa hora que podemos "amar os nossos inimigos, fazer o bem a quem nos faz o mal".

Meus prezados amigos, o Espírito Santo é tal como Maria e os Sacramentos um dom pascal, um presente de Cristo Crucificado. Como todo presente pode ser aceitado ou declinado, pode ser útil ou pode ser posto no sótão, ou até guardado para "passar adiante". É o risco de todo dom.

Acolhamos de verdade esses dons pascais que nos tornam pessoas pascais. Feliz Páscoa a todos.


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