PEDRAS, PÃO E CORPO

 

Com esta solene eucaristia iniciamos o Sagrado Tríduo Pascal. Nesses três dias pretendo refletir com vocês sobre as três tentações do Senhor. Cristo pouco fala ao demônio, ensinando-nos assim a não dialogar com a tentação, mas podemos compreender que, de certo modo o Senhor responde à cada uma das tentações em cada dia do Tríduo Pascal.

Sabemos que a primeira tentação que Satanás lança contra o Senhor era transformar as pedras em pão. Bento XVI recordava que essa seria a grande tentação que acompanharia a Igreja ao longo dos séculos: tornar-se uma instituição simplesmente capaz de assegurar o pão material. Reduzir o mistério cristão à busca por um mundo melhor. Retirar toda a transcendência da missão da Igreja para cairmos no abismo sem fim da imanência.

Ao tentador, o Senhor responde que mais do que do pão o homem se alimenta da Palavra de Deus. Ali, Nosso Senhor anunciava já o Santíssimo Sacramento, mas certamente o tentador não compreendeu, porque não pensa como Deus...

À tentação de fazer um estrondoso truque de mágica tirando pedras transformadas em pão de alguma cartola, Nosso Senhor responde com o silêncio da Hóstia Consagrada. Não quis transformar as pedras em pão, mas quis e fez que o seu Corpo, Sangue, Alma e Divindade se tornasse o alimento dos fiéis.

No princípio era a Palavra, nos recorda S. João. Ao dizer que o homem vive da Palavra de Deus, Nosso Senhor nos ensina que Ele, Pão vivo descido do céu, é o alimento de nossas almas. Jesus é Ele mesmo “toda palavra que sai da boca de Deus”.

Porém há outro golpe com que a Instituição da Eucaristia fere o infernal tentador: o silêncio. A proposta do tentador era de um show, de uma pirueta, de um espetáculo: pedras transformadas em pão. A resposta de Jesus é, como dizia meu Pai S. Francisco, “a humildade sublime e a humilde sublimidade”, da Hóstia Consagrada. Ali, o Senhor não transforma, mas transubstancia. Se transformasse seria uma evidência, e não precisaríamos da fé, uma vez que a fé é, por definição, acreditar no que não se vê...

Mas o Senhor, discreto, humilde, simples faz mais, embora pareça menos. Ele prefere manter a aparência do pão, trocando – verdadeiro milagre invisível – a substância do pão pela própria substância do Verbo Encarnado. E assim a nossa fé entra em ação: dobramos nossos joelhos diante do que os olhos dizem pão, mas a fé diz Jesus. E aprenderemos com isso a viver assim em outras circunstâncias da vida. Aprenderemos que a fé vê melhor do que os olhos.

O Senhor não usa de seu poder em benefício próprio, mas para o nosso bem. Aquele que podia transformar pedras em pão para matar a sua fome, preferiu fazer-Se Ele mesmo alimento para a nossa fome. Quem imaginaria que aquele: “Dai-lhes vós mesmos de comer!” Chegaria a um tão retumbante extremo!

Que raiva não deve ter sentido o diabo quando ouviu as palavras da Consagração ditas na última ceia! mais raiva ainda quando o Senhor confiou aos Apóstolos o poder de renovar essa mesma maravilha. O diabo que não quis sujeitar-se a Deus agora vê que Deus decidiu sujeitar-se aos homens, descendo dos céus simplesmente porque um homem repetiu as Palavras de Nosso Senhor sobre o pão e o vinho.

Essa é a razão porque todo o mal que o tentador consegue infiltrar entre os discípulos de Cristo tem como finalidade atingir o Santo Sacrifício da Missa. Se Satanás pudesse esganaria todos os padres, para que no mundo não houvesse mais Missas. Como ele não deseja que a Igreja tenha mais mártires, então ele leva os sacerdotes à tibieza, fazendo com que deixem suas orações para depois, mas continuem celebrando; depois deixem a oração para nunca, mas continuem celebrando, mas celebrando de um modo que Aqu’Ele que têm em suas mãos já não seja o Amado cujos amores são melhores que o vinho, mas um conhecido com quem temos certas obrigações. E quando amor vira apenas obrigação, mais cedo ou mais tarde, vira nada.

E se o Corpo de Cristo não encanta mais o Sacerdote, qualquer outro corpo lhe será mais atraente. Desde o corpo robusto de uma boa conta bancária, de um carro ou até qualquer coisa que se mexa por aí. A satanás interessa mais ter muitos sacerdotes que não têm ideia de quem são, do que ter dois ou três novos Curas de Ars. Com os fiéis leigos não é muito diferente.

Queridos amigos, nossa oração hoje se dividirá em três circunstâncias: a mais extremada gratidão pelo dom incomparável do Santo Sacrifício da Missa; a mais intensa oração pela santidade do clero e de todo o povo de Deus; a necessidade de fazer companhia a Jesus no monumento, vigiando pelo menos uma hora com Ele.

Disse S. Boaventura:   Se Ele nos amou tanto assim, quem poderia não amá-l’O?


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