HORA?


 Por aquelas razões que ninguém sabe explicar, você saiu atrasado, esqueceu o celular, está sem relógio, o carro não pegou e o ônibus não chega.

Então você se dirige para uma pessoa que está com relógio no punho e celular na mão e diz com expressão aflita: "Olá! São que horas?"

E a pessoa ao ouvir sua pergunta, olha para você calmamente e diz:

" Hora. Que coisas são as horas! Esse espaço no qual transcorrem nossas vidas, podendo ser 8 ou 9; 11 ou 12. O que importa? A hora. Esse ser inexorável que poucas chances tem de vir sozinha, pois ainda têm os minutos. E o que significa isso para cada um de nós? Horas e minutos que nos consolam e perseguem..."

De repente surgem em torno dessa pessoa outras com instrumentos e microfones e começam a cantar: "Tempo, tempo, tempo, tempo..."

E após repetir pela quinta vez a música desde o início, todos lhe dão um sorriso e vão embora cada um para um canto. 

E você só sabe que ficou mais atrasado, e continua sem saber a hora.

Por mais absurda que possa parecer essa cena, é o que se têm vivido na Igreja Católica e de uma forma cada vez mais intensa e danosa.

S. Pio X ao falar sobre a Igreja usava as expressões "Igreja docente" e "Igreja discente". A Igreja docente seria a hierarquia, a quem cabe ensinar. E a Igreja discente seriam os simples fiéis a quem cabe aprender. Porém há no ensino, em qualquer ensino, uma necessidade premente chamada clareza.

A isso Nosso Senhor já exortava: "Seja o vosso sim, sim. E o vosso não, não." E para ser ainda mais claro, completou Nosso Senhor: "O que é além disso vêm do maligno."

O modernismo que não é apenas uma heresia, mas como que um compêndio de todas elas, tem, como método, esvaziar a simplicidade e a clareza da doutrina para preencher com os salamaleiques de frases compridas e vagas, com parágrafos de 3 páginas, com uma tentativa - fracassada - de poesia.

Todo modernista é um poeta que não deu certo.

Porque o poeta, diz sem dizer. E o modernista não diz, dizendo.

Assim, um poeta fala da lua, da estrela e do mar, mas o faz com tanta maestria que num determinado momento percebemos que fala de sua esposa, de sua mãe ou de sua filha.

O modernista, porém, começa a falar de um assunto que não se compreende e conclui de um modo que ninguém entende.

Afinal é sim ou não? "O que passa disso vêm do Maligno..."

Então, por exemplo, perguntamos a Bento XVI: "Vossa Santidade, afinal de contas, é ou não o Papa legítimo?" E recebemos por resposta: "Todo sempre é também um para sempre".

Maravilha.

Outro dia, ouvi um padre dizer na Televisão: "Toda ausência é uma não-presença." E as pessoas quase se derreteram diante dessa frase que é tão óbvia que beira à imbecilidade.

O discurso modernista odeia a clareza.

E para destruir a clareza utiliza-se de alguns recursos:

1. A distinção entre a doutrina e a prática, descendo a casos e casos para comprovar que, embora exista a doutrina ela é, no final das contas inaplicável. Portanto, inútil.

2. O uso de neologismos teológicos em substituição dos termos já consagrados pela Tradição.

3. A mentalidade de que se vale ao poeta o uso da "licença poética", ele também pode criar uma "licença teológica", o nome que se dá a isso atualmente é "pastoral". O que os modernistas querem dizer com a palavra "pastoral" é o que antes chamaríamos de danoso, perigoso, heteredoxo e... herético.

Assim, no âmbito teológico, "pastoral" é o mesmo que, no âmbito das brincadeiras infantis significa a expressão "café com leite". 

De modo que à constatação de um ensinamento que se opõe à doutrina, tudo se resolve dizendo que não se está no âmbito doutrinal, mas pastoral, ou seja, vale tudo, "café com leite".

Mas analisemos essa palavra, por si belíssima: pastoral. 

Quem é melhor pastor: o que leva as ovelhas a um campo de grama saudável e verdejante ou o que as leva um campo com um ou outro resquício de capim e que tem, ainda por cima, cogumelos venenosos?

Então à essa mistura teológica atual, o próprio nome de "pastoral" é uma profanação.

Por isso, foi exatamente essa nova concepção de pastoral que fez com que os pastores deixassem de ser o que deveriam, ou mesmo ser o oposto do que que deveriam. Ou seja, ou os pastores deixaram as ovelhas à sua própria sorte, ou se tornaram lobos.

Aqui, se justifica o movimento que percebemos cada vez mais freqüente de que as ovelhas tomem para si a sua própria defesa, o que sempre foi estabelecido pela Igreja: "Se o pastor abandona o rebanho ou se torna uma ameaça para o rebanho, cabe ao rebanho defender-se".

Curiosamente, nesse momento, há uma revitalização de princípios que pareciam ter caído em desuso: submissão, obediência, hierarquia, clero, autorização...

É outra característica do modernista: ele não enrubesce ao se contradizer.

Nesse sábado, peçamos à Nossa Senhora: "Salvai a Igreja". E esperemos.

Esperemos lutando. Lutemos perdendo. Percamos confiando. Confiemos caindo. Caiamos atirando.

Deus se usará de tudo isso.

E ficará mais claro ainda que foi Maria quem venceu.






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