REALIDADE

 

Celebrávamos ontem a segunda aparição da Santíssima Virgem à Santa Catarina Labouré, quando a Santíssima Virgem pediu à nossa Santa que cunhasse a medalha que se tornou conhecida como Milagrosa. Hoje celebramos essa mulher admirável que com os olhos no céu jamais tirou seus pés da terra, da realidade.

Quando levava ao seu diretor espiritual o conteúdo de suas visões, Pe. Aladel recordava à vidente que uma filha da caridade existe para servir aos pobres "e não para sonhar". E Santa Catarina vivia profundamente essa admoestação: servir os pobres.

Passado o tempo de noviciado, foi enviada para o asilo de Enghien onde ficou por 45 anos ocupando-se dos serviços mais humildes como cuidar da portaria e do pombal. 

Servir os pobres. Quando pensamos nas obras de misericórdia, é natural que haja um certo romantismo, uma ideia de que aqueles a quem as obras se destinam as recebem de bom grado, cheios de gratidão e contentamento. Só que, na realidade, geralmente não é assim. Muitas vezes o pobre quando acolhido em uma casa de caridade, por mais que aqueles que acolhem se esforcem por servi-lo bem, ele não responde ao cuidado com gentileza, mas até mesmo com grosserias.

São Vicente de Paulo já preparava as futuras filhas da caridade para essa questão que, no princípio, afugentou a muitas colaboradoras. E Santa Catarina, certamente desde os tempos em que trabalhava no restaurante de seu irmão, já tinha adquirido a capacidade de passar por grosserias e inconveniências sem perder a tranquilidade e a humildade que tanto lhe caracterizavam. 

Talvez um dos maiores empecilhos para a santidade na vida comum (matrimonial, conventual etc) não sejam tanto os defeitos daqueles que convivem conosco e os nossos, mas a idealização que fazemos de nós mesmos e daqueles que estão próximos a nós.

Em outras palavras, não conseguirá ser santo quem não consegue conviver com a realidade.

A esposa que idealiza o marido, o marido que sonha com uma esposa perfeitíssima, os filhos que imaginam pais sem defeito, pais que esperam filhos sem nenhum problema, religiosos que querem um superior de bondade infinita... todos se condenam a um sofrimento que só é capaz de gerar num primeiro momento decepções e em seguida gera o ódio por quem devíamos amar.

Realidade.

É difícil servir os pobres.

Minha esposa é ciumenta.

Meu marido é imaturo.

Meu superior responde com um coice cada vez que me dirijo a ele.

Só a partir dessas considerações, por vezes duras, somos capazes de colocar a única coisa capaz de mudar verdadeiramente alguém: o amor. Mas o amor só muda o outro quando primeiro mudou a nós.


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