GRAÇA


Quando o peregrino entra na Capela de Rue du Bac não passam despercebidas aos seus olhos milhares de placas que estão fixadas nas paredes onde basicamente está escrito: MERCI, isto é, obrigado. Esse não é um costume só ali. Só Leonardo de Porto Maurício que viveu duzentos anos antes da Aparição de Nossa Senhora em Rue du Bac escreveu que, olhando para si mesmo, não podia deixar de se sentir como as paredes dos antigos santuários onde por todos os lugares está escrito: POR GRAÇA DE MARIA. O Santo assim, reconhecia a si mesmo, a sua alma e todas as suas capacidades como uma graça recebida de Nossa Senhora.
Tudo por graça de Maria.
Sim, queridos amigos, tudo que temos e somos de bom está contido nesses raios luminosos que a Virgem faz cair sobre o mundo. Tudo é graça, e graça de Maria. Assim como os filhos devem tudo às suas mães, nós devemos tudo à Maria.
A invocação de Nossa Senhora das Graças é anterior à Medalha Milagrosa. O próprio convento em que Padre Pio viveu, que, salvo engano é do século XVII, tem a Igreja conventual dedicada à Nossa Senhora das Graças. E como se dava essa representação de Nossa Senhora?
A representação antiga da Senhora das Graças pode nos parecer um pouco estranha, no caso do Convento de Padre Pio, Nossa Senhora tem no colo o Menino Jesus que abre duas frestas na túnica de Nossa Senhora apresentando seus seios. O que quer representar isso?
Tal como a mãe nutre seus filhos com seu leite, a Virgem Maria nos nutre com o leite de suas graças. Se a criança não vive sem o leite materno, nós não viveríamos se não recebêssemos as graças de Maria. Porém essa imagem antiga me fez pensar uma coisa. Conheço muitas jovens mães e algumas delas falam de uma certa dificuldade da criança em ser amamentada. Que nem todas as crianças mamam de primeira e que às vezes a criança não aceita o peito da mãe...
Que tristeza e que angústia essas mães experimentam enquanto a criança não "pega o jeito" e mama alegremente todo o leite, até saciar-se.
Queridos amigos, Nossa Senhora é nossa Mãe, mas parece que nós nem sempre acreditamos nisso realmente. E nem sempre estamos muito sedentos de seu leite, de suas graças. E a razão principal de não desejarmos o leite de Maria se divide em duas: perda de paladar e perda de confiança.
As vezes já provamos tantas outras coisas que o leite de Maria parece-nos menos apetecível. O mundo nos oferece tanta gordura, tanta comida, que o leite de Mãe pode nos parecer menos saboroso. Mas o que o mundo nos oferece entope nossas "artérias espirituais" e acabará por fazer parar o coração de nossa alma. Já o leite de Maria sacia sem saciar, é como diz a Sabedoria de si mesma: quem se alimenta de mim terá ainda mais fome, o leite de Maria gera a vida da graça em nós.
A outra razão é a desconfiança. Imagine uma criança que (se fosse possível) pedisse uma análise laboratorial do leite de sua mãe para ter certeza se é bom mesmo, se não lhe vai causar nada de mal, se é seguro... Assim nós tememos nos entregar inteiramente às graças de Maria porque temos medo de, no meio delas, encontrar a cruz. Aqui, o problema não é o sofrimento, ao qual todos os seres humanos estão sujeitos, mas a compreensão do sofrimento ou como uma falha de Deus, que num momento se esqueceu de nós e então veio o sofrimento; ou o sofrimento como um castigo injusto que Deus nos enviou para ficar nos vendo sofrer lá do céu...
E nessas horas parece que a Virgem falhou. Não nos protegeu. Ou pior ainda, nos traiu.
Meus amigos, a cruz é o momento das maiores graças. Não só pela graça imensa que a própria cruz é, coisa que só percebemos se tivermos fé de verdade (não aquele irritante pensamento positivo que todo mundo acha que é fé), mas porque, sendo difícil e até mesmo repugnante à nossa natureza, Nossa Senhora se faz ainda mais presente e nos concede ainda mais graças, não tanto para a cruz ir embora - como se fosse um bicho papão - mas para que ela permaneça e nós permaneçamos nela, de pé, como a Virgem permaneceu.
É verdade que as cruzes que mais nos ferem são as cruzes de quem amamos. A alma generosa, se pudesse, levaria sobre si todos os sofrimentos para que ninguém sentisse o menor incômodo. Só que não é possível. Se a cruz, o sofrimento, não tivesse um "quê" de mistério, para que nos serviriam a fé e a esperança?
Quando as cruzes que mais nos ferem forem as dos outros, agarremos ainda mais em Nossa Senhora. Não pensemos que seu sofrimento durou "apenas três horas". Todas as mães desejam filhos saudáveis, mas esse ser saudável, geralmente mais que as doenças se referem aos sofrimentos e aos riscos de morte que uma criança pode suportar. Se por um lado, Nosso Senhor nunca esteve doente, por outro lado, nunca esteve livre da morte e do sofrimento. Desde o nascer num estábulo, a fugir para o Egito, às tentativas de assassinato ao longo do ministério, etc etc até que finalmente a cruz chegasse de forma plena.
Poucas mães aceitariam - se fosse o caso de aceitar ou não - ter um filho como "problemático" como Nosso Senhor. Mas Ela aceitou, para que pudesse compreender o maior sofrimento que se pode ter - o da mãe que sofre por um filho - sem teorias, mas na própria carne, no próprio coração transpassado pela espada.
Queridos amigos, agarremo-nos a essas mãos que hoje particularmente se estendem sobre todo o mundo, e digamos hoje a Nossa Senhora, por nós e pelos outros: Ó Maria concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a vós.



 

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