DISCURSOS

 

Na primeira leitura da Santa Missa de hoje, o Apóstolo cria uma oposição entre a pregação do Evangelho e os discursos da sabedoria humana. Em outras palavras, S. Paulo reforça a simplicidade do Evangelho e a natural mudança que o Evangelho produz em nossa vida. A força do Evangelho não está em discursos habilmente preparados, com recursos da oratória e capacidade de convencer, mas em expor de forma clara o amor de Deus por nós manifestado na Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo, Nosso Senhor.

Essa simplicidade do Evangelho pode ser causa de desprezo para aqueles que, não o querendo compreender em sua grandeza, imaginavam uma doutrina mais rebuscada e palavras mais difíceis...
Celebramos há poucos dias S. Agostinho, antes de sua conversão era um homem acostumado à leitura dos grandes autores de sua época, com palavrórios rebuscadíssimos, frases de várias linhas, parágrafos imensos, jogos de palavras... e, quando tem nas mãos os Evangelhos, acaba por desprezá-los por julgar uma linguagem simples demais, até mesmo infantil. Para o Agostinho não santo, ler o Evangelho era como dar a um Acadêmico um gibi da turma da Mônica...

A questão é que a simplicidade é a marca de Deus. E a simplicidade favorece a compreensão dos humildes, ao mesmo tempo em que convida os mais sábios a penetrarem nos grandes mistérios que se ocultam nessa básica simplicidade. Assim, uma Santa Zita, empregada doméstica e um Santo Tomás, a luz dos teólogos, podiam professar a mesmíssima fé, crer nas mesmíssimas coisas e serem católicos na mesma medida.

E mais, aquele que consegue compreender o mais íntimo da teologia, torna-se capaz de discursar diante de uma platéia de doutores e de ensinar o catecismo básico à crianças. Assim fazia, por exemplo, o mesmo Santo Tomás, que durante as quaresmas ia para os campos, ensinar o credo aos camponeses.

Quando lemos Santo Tomás, compreendemos com clareza cristalina como todos os artigos de nossa fé, toda nossa liturgia, toda a nossa vida moral estão concatenados de forma absolutamente simples e clara. Uma verdade vai trazendo à luz outra verdade, sem ambiguidades, sem dúvidas.

Mas a luz nem sempre é bem-vinda. Aquele que vive na escuridão incomoda-se com a luz. Por isso, desde muito tempo, vêm surgindo na Igreja pensamentos que são exatamente o oposto daquela objetividade, simplicidade e clareza de que se valia S. Paulo e criam com uma complicação ímpar, uma doutrina onde nada mais é doutrina.

Um escudo usado por esses "pensadores" é justamente a palavra "pastoral". 
Sabe, quando éramos crianças, e em certas brincadeiras dizíamos ser "café-com-leite", ou seja, ainda que nos "pegassem", continuávamos a brincar porque no fundo podíamos tudo... Mais ou menos assim se tornou a palavra "pastoral" em nossa Igreja. 

O primeiro erro é antepor "pastoral" a "teológico", ou seja, cria-se na mente uma idéia de que uma coisa é a teoria, outra a prática. E ao invés de aplicar o princípio ao caso concreto, aplica-se o caso ao princípio, gerando uma verdadeira demência eclesial.

Assim, por exemplo, "pastoral" se tornou a arte de dizer qualquer coisa, sem nenhum conteúdo doutrinal, e se for oposto à Santa Doutrina, a resposta será que não se estava discutindo a "doutrina", mas a "pastoral".

Um resultado prático disso é que a maioria dos fiéis não sabe mais em quê crê. Os sermões, em muitos casos, se tornaram tão vagos, tão intimistas, tão simbólicos, tão poéticos que a pessoa sai da missa num Domingo de Páscoa sem ter a mais vigorosa certeza de que Jesus ressuscitou.

Jesus ressuscitou? Ou foi sua mensagem que reviveu no coração dos discípulos? Ou foram os discípulos com medo que se tornaram corajosos? 

Jesus ressuscitou. Por que? Porque é Deus imortal. E tendo assumido nossa carne num estado padecente, para que pudesse sofrer e morrer na cruz, três dias após sua morte, para que se cumprisse a Escritura, sua alma se une ao seu corpo, agora glorioso, ou seja imortal e impassível. 

Pronto. 

Queridos amigos, como é bom ouvir as coisas com clareza. Primeiro, porque muitas vezes não temos muita paciência para ouvir. Segundo, porque a nossa inteligência despreza um discurso do qual se pode concluir tanto que sim como que não uma mesma realidade...

"Que os lábios dos sacerdotes guardem a Santa Doutrina", reza a ladainha de Cristo Sumo e Eterno Sacerdote. Rezemos hoje assim, e busquemos por nós mesmos essa clareza própria da nossa Santa Fé.


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