CORPOS


O fato de termos certa intimidade com as Sagradas Escrituras, o que é bom, pode ter como "lado ruim" que certos textos nos sejam tão familiares que o julgamos uma fonte jé esgotada. Mas jamais será assim. Já recordavam os Santos Padres que ninguém deve se sentir chateado por beber de uma fonte até saciar-se e a fonte continuar jorrando, porque voltaremos a ter sede e voltaremos à mesma fonte que sacia sem acabar. Assim lemos hoje um texto da Santa Escritura e apoiados na Tradição da Igreja o compreendemos de um jeito. Ano que vem o mesmo texto, apoiado na mesma Tradição nos revela um sentido novo, mais útil às nossas almas.

Assim, na Segunda Leitura da Missa de hoje, bem curtinha por sinal, o Apóstolo diz, segundo a tradução do Lecionário: "Eu vos exorto irmãos a vos oferecerdes a Deus (...) este é o vosso culto espiritual."
Só que não seria errado que busquemos o mesmo texto em outras traduções, e se formos ao texto grego mais próximo do que seria um "original" não vemos esse pronome reflexivo: "vos" oferecerdes... Mas encontramos algo bem mais concreto: "Eu vos exorto a que ofereçais os vossos corpos..." Pode parecer que a diferença é pequena, mas se olharmos com atenção não é. S. Paulo apresenta que o objeto da oferta não é um bem espiritual ou moral, mas o corpo (soma, em grego). E é o corpo oferecido o sacrifício espiritual.

Isso não é contraditório? 

Não.

O corpo, dentro desse culto que é espiritual, tem apenas um único papel: ser oferta, ser hóstia. Não importa tanto o que esse corpo faz, sua eventual saúde, ou suas magníficas capacidades: o papel do corpo é ser oferecido. E oferecido num culto espiritual, ou seja, num culto onde embora ele seja a oferenda, ele não exerce nenhum rito, nenhuma ação. Ele se deixa ofertar.

Queridos amigos, muito se fala em "participar" da Missa, como um sinônimo de uma interação do corpo com o Sacrifício Eucarístico. De modo que, quanto mais coisas faço: leio, canto, danço, bato palmas... (infelizmente é o que a maioria pensa) tanto mais a missa foi participada.

Mas o que é a Missa em sua essência?

Em sua essência, a Missa é a renovação incruenta do Sacrifício do Calvário. E como o Corpo de Cristo participou dessa Missa? O que fazia? Nada. Estava costurado à cruz com pregos! Seu corpo era uma  chaga! Nada de são havia n'Ele, dirá o profeta. E é nessa inércia física que Cristo pode celebrar a sua Missa, oferecendo aquele Corpo agonizante a Deus Padre pela Salvação dos homens.

O culto cristão é espiritual. Ele se dá em nosso corpo, porque não somos puros espíritos, mas pela oferenda de nossa corpo, esteja como estiver, prestamos culto a Deus. Assim desde o atleta mais fantástico até o velhinho que sofreu derrame, todos!, podem oferecer a Deus seus corpos como culto espiritual.

Isso recorda a santidade de nosso corpo, o próprio S. Paulo nos exortará que devemos estar revestidos de Nosso Senhor Jesus Cristo e que é nossa obrigação trazer a Deus em nossos corpos. A primeira preocupação de um cristão não é com a saúde de seu corpo (que mais cedo ou mais tarde vai se deteriorar, desculpe lembrar isso...) mas com a santidade de seu corpo. E guarda-se a santidade do corpo vivendo especialmente a temperança e a castidade.

A temperança consiste em dar ao corpo o que ele realmente necessita, nunca mais. Às vezes, menos. Precisamos descansar, comer, dormir, beber e não é errado que tenhamos alguns prazeres como uma poltrona confortável, um balanço no quintal... mas precisamos ser senhores de todas essas coisas e não sermos dominados por elas. Ligada à virtude da temperança está a santa penitência, que consiste em, vez por outra, dar menos ao corpo. Castigá-lo um pouco, como um potrinho selvagem que ele, em certo sentido, é. Então fazemos pequenas privações ofertando-as a Deus, para não cairmos sob o jugo de nós mesmos, que é a pior escravidão. Sim, meus amigos. Pior até que ser escravo do demônio é ser escravo de si mesmo. E nos libertamos pela penitência.

A castidade é outra virtude extremamente simples. O sexo não é uma necessidade do ser humano, mas do gênero humano, da raça humana. Um homem não vive sem alimentar-se, sem dormir... mas pode viver sem sexo. Sim, eu sei que isso é uma grande novidade pra muita gente...
Mas se todos fizessem voto de castidade perfeita, o ser humano desapareceria... Sendo assim, o sexo é uma necessidade não da pessoa, mas da raça.
A castidade consiste no exercício da vida sexual dentro de sua própria vocação. Ou seja aqueles que consagram-se a Deus pelo celibato ou os que não são ainda casados não viverão, sob pena de pecado mortal, nenhuma experiência sexual (nem sozinho, nem em vistas, nem em toques). 
Os que namoram evitarão todo tipo de manifestação de afeto que possa ferir no outro o amor de Deus, tais como beijos, abraços etc. 
E aqueles que se consagram a Deus pelo matrimônio terão o imenso desafio de viver a sexualidade apenas como um dom de Deus para a continuidade do gênero humano e como manifestação de amor entre os esposos. É mais difícil você não usar uma coisa, do que usá-la com moderação, por isso os casais são mais fortes ao viver a castidade própria de seu estado do que aqueles que prometeram castidade perpétua, como os padres.

Queridos amigos, fundou-se uma nova religião. O nome dela é saúde.

Infelizmente, como se vê na foto acima, em muitos países como as pessoas não vão mais à Igreja, as igrejas se transformaram em academias, restaurantes... Conventos se transformaram em hotéis... E a saúde se tornou um bem a conquistar e a se manter a todo o custo...
É importante ter saúde.
Mas mais importante é ofertar a Deus, como sacrifício espiritual o nosso corpo, mesmo que decrépito.
Muitas pessoas nesses tempos passaram pela doença como um fracasso e alguns viram a morte como um desastre.
É o catecismo dessa nova religião que nós, mesmo sem perceber, aprendemos.
Santa Teresa dizia de forma tão bela que se temos saúde é para gastá-la por Deus! E se não a tivermos, ainda temos em nós essa hóstia que Ele deseja receber em cada momento, especialmente quando Ele-Hóstia se dá a nós.

Aproveitemos os momentos de "molho" que passamos para pedir ao Nosso Senhor e à Nossa Senhora que visitem nossas almas com sua graça, que nos deem santas inspirações e ânsias de co-redimir com Eles a humanidade.






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