BEIJO

Duas vezes por ano recordamos a Transfiguração do Senhor: no Segundo Domingo da Quaresma e no dia 06 de agosto. Mas, qual o sentido dessa ação do Senhor? Por que Ele se transfigura diante de três de seus Apóstolos?
A recordação desse evento na estrada da Quaresma vêm para nós no mesmo sentido do desejo do Senhor: diante da proximidade da cruz, a transfiguração será um momento de glória que pode fortalecer o coração desses Apóstolos diante da humilhação da cruz.
Porém, devemos reconhecer, que Nosso Senhor "acertou" somente em 1/3 de sua intenção, uma vez que Tiago foge e Pedro, além de fugir, nega e três vezes. Só João continua junto do Senhor até o fim.
Ao comentar o Cântico dos Cânticos, S. Bernardo fala dos beijos que a amada pede de seu amado: "Beija-me com os beijos de tua boca!", assim começa propriamente o livro.
Segundo S. Bernardo, esses beijos do amado na amada, são essas intervenções fortes de Deus em nossa história: um momento místico mais forte, um arroubo espiritual, uma graça que se alcança etc.
Mas, continua o Santo, esses momentos são raros e breves, ao ponto de que se uma pessoa tiver apenas um momento desse em sua vida, já deveria se sentir muitíssimo agradecida a Deus.
Voltando à Transfiguração, vemos essas duas características apontadas por Bernardo: foi breve e única. A sua brevidade de poucos minutos comparada às horas da paixão, desde a prisão até a morte, e particularmente às três horas de agonia na cruz, não deixa de ser muito significativa.
Mas, por que "não deu certo" para Pedro e Tiago esse "beijo" da Transfiguração?
Porque, segundo Bernardo, ao receber o beijo do Amado, a amada deve corresponder beijando-o com os dois lábios, que na concepção do Santo de Claraval são o amor e o conhecimento.
Aparentemente, Pedro beija somente com o lábio do amor, é tocado pelo momento, quer que ele dure para sempre, quer construir tendas... o beijo gera nele apenas o sentimento, que sem o conhecimento gera apenas emoção, sentimentalismo vazio de razão, que vão embora na hora da dificuldade. Por isso, ele nega e foge.
São Tiago não diz nada, mas pelo que se pode perceber de sua personalidade ao longo da Bíblia, ele parece beijar apenas com o lábio do conhecimento, da razão. Constituindo um admirável esquema mental e teológico, mas que, sem o amor se torna apenas um discurso científico sobre um objeto conhecido, não gera paixão e amor, por isso ele também foge.
Ao contrário João, beija com os dois lábios. Nele amor e ciência se conjugam e se completam gerando um conhecimento profundo e uma caridade ardente, capazes de uní-lo ao Senhor e a Virgem Santa no momento mais sombrio de Suas Vidas: a Cruz e a Morte do Redentor.
Queridos amigos, tudo na vida do Senhor gira em torno do Mistério Pascal, e os seus beijos querem nos preparar para vivermos junto d'Ele os nossos mistérios pascais. Que, o Senhor se digne fortalecer-nos para que a força de seu beijo seja mais forte em nós que a natural repugnância que a cruz nos produz.

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