CORDEIRINHA

A Seqüência Pascal traz a afirmação: "O Cordeiro redimiu as ovelhas".
Jesus é o Cordeiro de Deus, como afirmou S. João Batista e também como insiste em vários detalhes do seu Evangelho o Evangelista S. João. Todos nós também somo ovelhas do Senhor. Mas a alguns cabe a honra imensa de serem promovidos à cordeiros.
Na natureza, entre quem entende do assunto, de modo geral se fala de ovelha também para os carneiros e para os cordeiros, mas o certo seria dizer que carneiro é o macho, ovelha é a fêmea e cordeiro é o filhotinho.
Mas, na pecuária do Reino, temos uma liberdade maior de classificação: todo batizado é ovelha do Senhor, e o Senhor é o Cordeiro de Deus.
Porém, no seu gosto imenso de partilhar, Jesus também partilha esse seu ser cordeiro com algumas das suas ovelhas. Na pecuária do Reino, ovelha é quem é cuidada e cordeiro é quem se faz pequeno, tão pequeno ao ponto de poder ser esmagado, como Jesus foi esmagado.
Os mártires vivem esse mistério eucarístico do serem trigo triturado, uva pisada, cordeiro sacrificado.
Inês viveu isso.
Seu nome traduzido do latim seria mais ou menos isso: cordeirinha.
E assim foi sua vida.
Na época breve vida.
Agora eterna vida.
Se chegou aos 12 anos, deles não passou muito.
Num tribunal não poderia ser testemunha: por ser mulher e criança.
Mas no Reino de Deus foi testemunha (é o que significa a palavra grega mártir) de Deus e de seu Ungido.
Tão pequena, foi algemada. Mas a argola das algemas era maior que seus punhos, e escapavam...
O soldado percebeu ser sua espada maior que aquela pequenina do Reino, e sequer sabia como usar algo tão grande num corpo tão pequeno.
Mártir e Virgem. Na sua pequena cabecinha os anjos colocam dupla coroa, e o céu se reveste do branco da virgindade e do vermelho de mais um sangue que se junta na torrente de sangue que tem como fonte o lado aberto do Cordeiro na Cruz.
Queridos amigos sem o menor escrúpulo de tornar grande demais nossa hodierna reflexão, gostaria de encerrar como uma poesia de S. José de Anchieta em honra de S. Inês. É um Santo louvando uma Santa e ainda Anchieta dá um "tempero eucarístico" na poesia. Certas palavras não nos são mais tão conhecidas, um dicionário ou o google talvez ajudem, mas saboreie e re-saboreie essa belíssima poesia do primeiro e maior educador de nossa nação: 



Cordeirinha linda,
como folga o povo
porque vossa vinda
lhe dá lume novo!


Cordeirinha santa,
de Iesu querida,
vossa santa vinda
o diabo espanta.


Por isso vos canta,
com prazer, o povo,
porque vossa vinda
lhe dá lume novo.


Nossa culpa escura
fugirá depressa,
pois vossa cabeça
vem com luz tão pura


Vossa formosura
honra é do povo,
porque vossa vinda
lhe dá lume novo.


Virginal cabeça
pela fé cortada,
com vossa chegada,
já ninguém pereça.


Vinde mui depressa
ajudar o povo,
pois com vossa vinda
lhe dais lume novo.


Vós sois, cordeirinha,
de Iesu formoso,
mas o vosso esposo
já vos fez rainha.


Também padeirinha
sois de nosso povo,
pois, com vossa vinda,
lhe dais lume novo.


Não é d’Alentejo
este vosso trigo,
mas Jesus amigo
é vosso desejo.


Morro porque vejo
que este nosso povo
não anda faminto
deste trigo novo.


Santa padeirinha,
morta com cutelo,
sem nenhum farelo
é vossa farinha.


Ela é mezinha
com que sara o povo,
que, com vossa vinda,
terá trigo novo.


O pão que amassastes
dentro em vosso peito,
é o amor perfeito
com que a Deus amastes.


Deste vos fartastes,
deste dais ao povo,
porque deixe o velho
pelo trigo novo.


Não se vende em praça
este pão de vida,
porque é comida
que se dá de graça.


Ó preciosa massa!
Ó que pão tão novo
que, com vossa vinda,
quer Deus dar ao povo!


Ó que doce bolo,
que se chama graça!
Quem sem ele passa
é mui grande tolo,


Homem sem miolo,
qualquer deste povo,
que não é faminto
deste pão tão novo!


Entrai ad altare Dei
virgem mártir mui formosa,
pois que sois tão digna esposa
de Iesu, que é sumo rei.


Debaixo do sacramento,
em forma de pão de trigo,
vos espera, como amigo,
com grande contentamento.
Ali tendes vosso assento.

Entrai ad altare Dei,
virgem mártir mui formosa,
pois que sois tão digna esposa
de Iesu, que é sumo rei.


Naquele lugar estreito
cabereis bem com Jesus,
Pois ele, com sua cruz,
vos coube dentro no peito,
ó virgem de grão respeito.


Entrai ad altare Dei,
virgem mártir mui formosa,
pois que sois tão digna esposa
de Iesu, que é sumo rei.


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