PEDIDO

Nesse dia 13 de maio, todos nos transportamos espiritualmente à Fátima.
Lembro-me de um conhecido padre português que certa vez teve a ventura de concelebrar a Missa com o Papa S. João Paulo II. Ao cumprimentar o Santo Padre no fim da Santa Missa, ocorreu-lhe de dizer: "Santo Padre, volte a Fátima, gostaríamos de o rever!" E, inesperadamente o Papa respondeu: " Eu vou todos os dias à Fátima".
Se não vamos todos os dias, pelo menos hoje precisamos ir.
Mas já que vamos, podemos usar ainda mais a nossa imaginação e ir não à Fátima de hoje, mas a de 1917. Ao invés da Igreja e da esplanada, vemos pedras, árvores, ovelhinhas e os pastorinhos....
Estão lá, ora brincando, ora rezando...
De repente, um relâmpago. Será que vai chover? Procuramos um abrigo.
Mas... o que é isso? Ai que senhora tão linda!
Está ali, sobre aquela azinheira, a Virgem mais branca que a lua, mais brilhante que o sol. Mesmo o calor do meio dia, parece ter ficado mais suave, diante da Virgem.
Não tenhais medo. Não vos faço mal.
Sua primeira frase imita a de seu Filho Ressuscitado. 
"De onde é Vossemecê?", perguntou Lucia com seu delicioso sotaque de portuguesinha.
Sou do Céu.
Céu...
Já tinha me esquecido dele, estou tão preocupado com as coisas daqui, que me esqueci da alegria de lá. O Céu... desdenhado pelos materialistas, e olvidado até mesmo nas pregações dos ministros de Cristo. O Céu... parece que Maria Santíssima pôs açúcar em nossa boca...
O Céu... quantas vezes o quis aqui: nada de problema, nada de doença, nada de contradição, tudo perfeito... Mas se ele acontecesse aqui, o que teríamos lá?
O Céu... quero mais. Quero o céu. Só ao dizer que veio do Céu, Nossa Senhora me fez esquecer desse vale de lágrimas e querer voltar com ela para lá...
"E que é que Vossemecê me quer?", perguntou Lúcia.
Um instante, Lúcia!
Você não ouviu que Ela disse que vinha do Céu? Então vamos pedir! Aproveitemos para enchê-la de pedidos!
Mas Lúcia não foi contaminada por esse mundo egoísta. Lúcia não aprendeu a pensar como nós: o que Ela pode fazer por mim? Lúcia, como toda alma cristã verdadeira, entendeu que ela é que estava ao dispôr de Maria, e não o contrário. Como geralmente pensamos.
 Vim para vos pedir que venhais aqui seis meses seguidos, no dia 13 a esta mesma hora. Depois vos direi quem sou e o que quero. Depois voltarei ainda aqui uma sétima vez.
Vim para vos pedir...
Me sinto um tanto nobre. Estou às ordens da Rainha do Céu.
É verdade que ainda estou segurando minha lista de pedidos (onde certamente a minha ordem de prioridade é bem diferente da d'Ela), mas ela com seu carinho materno, começou pedindo... e eu preciso escutar.
Mas no coração de Lúcia, e um pouco menos no meu, ainda ecoa o endereço dessa Senhora tão linda: sou do céu...
Céu...
"Eu eu também vou para o céu?" perguntou Lúcia.
Sim vais.
Meu Deus!!! como queria ouvir essa frase para mim! Mas vai ser difícil ouvir enquanto o meu céu for tão terreno, tão material...
"E a Jacinta?" continua Lúcia.
Também.
"E o Francisco?" seguiu Lúcia.
Também, mas tem que rezar muitos terços.
Terços! Meu Deus, cadê o meu? Estava aqui. Está certo que nem sempre rezo bem. E, talvez as vezes nem tenha rezado... Onde está o meu terço? Bolso direito... Bolso esquerdo... Achei! E se servirá para Francisco, servirá também para mim. Muitos terços! É pra já!
"A Maria das Neves está no céu?" disse Lúcia.
Sim, está.
Lúcia, será que não podemos já começar os nossos pedidos? Deixa pra lá essa sua amiga...
"E a Amélia?" interrompeu-me Lúcia.
Estará no purgatório até o fim do mundo.
Mais uma vez percebo que minha lista pode esperar. O purgatório... quantas vezes pensei que me contentaria com ele, como o aluno preguiçoso que vai passa na recuperação com a nota em cima da média... Purgatório até o fim do mundo... Deixa eu ver minha lista: onde está o meu pedido de ser santo de verdade, ter uma boa morte e ir para o céu? Deixa eu ver... hummmm... preciso de uma caneta...
Quereis oferecer-vos a Deus para suportar todos os sofrimentos que Ele quiser enviar-vos, em ato de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido e de súplica pela conversão dos pecadores?
Meu primeiro pensamento foi dizer que... não.
Eu vim aqui, me transportei no tempo e no espaço para trazer a Mãe de Deus os meus pedidos. E Ela, antes de eu pedir, me pede para aceitar exatamente o que gostaria de afastar para sempre da minha vida...
Nessa hora, reparei numa ovelhinha que estava com a patinha machucada... Ela mancava, dava um balidinho de dor...
Compreendi então que eu, a ovelhinha e todos os seres vivos temos uma coisa em comum: sofremos. Mas que só a mim, foi feita uma proposta para dar sentido ao sofrimento. Compreendi que o que queria desterrar da minha vida é a única coisa que pode me transportar ao céu...
Ainda pensava nisso, mas Lúcia já tinha dito imediatamente à Virgem: 
"Sim, queremos."
Eu ainda temia...
Ides, pois, ter muito que sofrer, mas a graça de Deus será o vosso conforto.
Graça...
Eu não tinha aprendido que ela bastava? Porque vou temer o sofrimento se me é certo o conforto da graça de Deus. Me sinto um pouco envergonhado, porque ainda temo. Talvez fosse capaz de propor à Nossa Senhora que não precisava me dar a graça de Deus... era só não permitir nenhum sofrimento em minha vida. A ovelhinha baliu de novo... 
Sim, eu quero! respondi um tanto atrasado.
Então percebi que a mesma luz que saía das mãos de Nossa Senhora e envolvia os pastorinhos, me envolveu também. Senti-me forte para combater sozinho os exércitos dos Estados Unidos e da Rússia. Mas compreendi que essa minha luta tinha outros inimigos e outros campos de batalha, e que se parasse de reclamar pelo ônibus estar cheio já seria alguma vitória...
Os pastorinhos caíram de joelhos e eu com eles e dissemos juntos: 
"Ó Santíssima Trindade, eu Vos adoro. Meu Deus, meu Deus, eu Vos amo no Santíssimo Sacramento".
Quando dissemos "Santíssimo Sacramento", a Virgem mostrou um contentamento tão grande, como quando a mais amorosa das mães escuta falar da obra-prima de seu filho...
E acrescentou já com um ar de despedida: 
Rezem o terço todos os dias, para alcançarem a paz para o mundo e o fim da guerra.
Terço, paz, guerra...
Nossa Senhora deu um peso especial a essas palavras, já tinha achado o meu e cheguei a mostrá-lo à Virgem que tenho certeza deu aceno com sua cabeça. E foi se elevando, levemente, suavemente. Ia em direção ao nascente.
Parecia que o céu se abria até que não mais a vimos...
Ela se foi...
Meu Deus, também está na hora de voltar! Ainda segurava a minha lista de pedidos. Tive uma idéia: virei o verso do papel e comecei a escrever: oferecer-me a Deus para suportar todos os sofrimentos etc...





Comentários